Março de 2015. Após algumas horas de viagem, cheguei finalmente ao hostel em Reykjavik. Na recepção encontrei um grupo de portugueses a fazer também o check-in. Estava sozinho ainda porque o meu amigo Fernando tinha ficado retido em Londres por causa do mau tempo. Devido a este imprevisto, não tinha a certeza se íamos ter tempo para fazer o percurso da Ring Road, mas ainda assim aproveitei para questionar esse grupo sobre o que tinham feito, se tinham encontrado estradas cortadas e se achavam que era possível fazer a Ring Road em apenas 5 dias. É claro que no meio da conversa, veio á baila a famosa aurora boreal, questionei eu: viram alguma?? Uma das raparigas do grupo respondeu logo que sim, na lagoa glaciar, mas que a aurora era na verdade uma pseudo aurora e que só se conseguia ver através da máquina fotográfica!!!
Acontece que o sensor da máquina fotográfica é muito mais sensível do que a vista humana, e por isso consegue captar uma aurora por muito mais fraca que ela seja… Fiquei um pouco na dúvida mas na esperança de também conseguir ver uma. O meu amigo Fernando já tinha visto algumas na Gronelândia e comentou que era uma experiência única e espetacular e que valia muito a pena. Enfim, ver uma aurora seria óptimo claro, mas esta ilha tem muito mais para oferecer, pensei eu.
Entretanto o Fernando chegou e iniciámos a nossa viagem, Golden Circle, estrada do sul e se correr bem ainda temos tempo para a Ring Road….
Desde a chegada a Reykjavik que cada noite que passava a minha ansiedade aumentava. O céu nunca esteve limpo, mas mesmo assim ia todas as noites à janela do quarto espreitar ou levava o carro para um local, mais escuro na esperança de encontrar céu sem nuvens e conseguir ver a tão desejada aurora.
No terceiro dia, acordámos na zona da Skogafoss, tínhamos chegado na noite anterior já tarde. Olho pela janela e vejo um imenso manto branco, estava a nevar imenso! Mesmo assim, prosseguimos com o nosso plano que era visitar Skogafoss logo pela manhã e seguir pela zona de Skogar, onde o está o avião despenhado na praia.
Quando chegamos junto á entrada do caminho para a praia do avião, novo imprevisto! Na altura ainda era possível levar o carro até lá (ou ir a pé claro), mas tínhamos alugado um carro pequeno e a estrada estava cheia de calhaus, levar o carro estava fora de questão, não ia correr bem. Toca a processar o que fazer!!! Enquanto estávamos a debater se valia a pena ou não fazer aquele caminho todo a pé só para ver o avião, reparo que estava um jipe a chegar á estrada. De repente, o instinto de um bom português desenrascado faz com que estique o braço e peça boleia. Uiii o jipe parou. Era um casal de chineses recém casados que estavam em lua de mel e amavelmente deram-nos boleia até ao avião. No caminho trocamos contactos e cada um seguiu a sua viagem.
Do avião seguimos para a praia de areia preta perto de Vik, seguido de uma paragem obrigatória no restaurante junto a bomba de gasolina para comer a tradicional sopa de borrego, e siga viagem para Skaftafell.
Quando chegámos a Skaftafell, deviam faltar umas três horas para escurecer. Tínhamos planeado ir ver a queda de água Svartifoss, uma das principais atracões do sul. Para lá chegar ainda tem que se fazer uma boa caminha e na altura não sabia bem quanto tempo demorava, por isso começamos a sondar algumas pessoas que estavam de regresso. Responderam que, com passada rápida, seriam uns 30 ou 40 minutos para cada lado. Já não tínhamos muito tempo de luz, mas a nosso favor estava o ritmo rápido e a lanterna que o Fernando se lembrara de trazer para a viagem.
Seguimos caminho e quando chegámos à queda de água, tirámos fotos, ficámos por ali um pouco a observar aquela maravilha de basalto hexagonal e a relaxar. Quando estávamos a regressar ao carro, avistámos no horizonte um espaço sem nuvens onde o sol espreitava tímido como se nos estivesse a convidar. Mas esta aberta nas nuvens era no sentido contrário do nosso hostel, situado perto da Lagoa Glaciar.
Toca a pôr as opções na balança… Ou andamos para trás e vamos na direcção do único local com o céu limpo, e que ainda por cima, segundo o site da Vedur temos um Kp índex de 9, (By the way, o Kp é uma escala de 1 a 9, onde 1 é pouco provável avistar uma aurora e 9 muito provável), ou vamos na direcção do hostel porque já se faz tarde. Não foi difícil decidir. Toca a entrar no carro e a fazer cerca de 50Km no sentido oposto ao hostel na expectativa de termos sorte.
Chegámos a um bom sítio onde ainda estava alguma claridade do dia e os meus olhos estavam fixos no horizonte à espera que a noite chegasse. Os segundos pareciam minutos e os minutos pareciam horas. Toca a atacar um chocolate que tínhamos no carro. Nunca mais ficava noite… estávamos ansiosos com a antecipação. De repente vejo no horizonte uma linha verde e grito para o Fernando: Olha ali uma! e tiro logo uma foto!
Saímos do carro e ficámos ali a observar maravilhados. Aos poucos foi ficando cada vez mais escuro e de repente mais uma linha verde no céu. Ambas estavam a movimentar-se na nossa direção até que ficámos mesmo por baixo de uma que dançava no céu. No local estavam uma mesas de madeira de piquenique e por ali ficámos sentados a absorver aquele espetáculo, era como se o tempo tivesse parado (nem frio tínhamos!). Não tenho palavras para descrever aquele momento. Lembro-me de estar ao telefone com a minha mãe e não conseguir explicar o que sentia. Era um dos objetivos da viagem e que se tinha concretizado naquele mesmo instante. É claro que uma viagem à Islândia vale sempre a pena, mas poder ver uma aurora boreal, é a cereja no topo do bolo. Principalmente se tivermos a sorte de a conseguir ver nítida e com os nossos olhos, sem recurso à tal máquina fotográfica.
Ficámos ali mais algum tempo e continuámos o nosso caminho, afinal de contas ainda tínhamos que conduzir para o hostel que ficava a uns 195km, e nas estradas da Islândia. Ao longo do percurso estivemos sempre acompanhados, a aurora não se cansou de dançar nas nossas costas, enquanto nos afastávamos. Quando chegámos ao hostel, cansados de um dia bem longo, fizemos o check-in e ainda fui lá fora me despedir dela e agradecer a sorte que tínhamos tido naquela noite.
Já tinha o desejo de ver uma aurora boreal à muitos anos e ainda por cima a primeira viagem que tinha marcado á Islândia teve que ser cancelada no dia anterior… uns 6 meses antes desta. Nessa semana tinha visto uma notícia sobre auroras no telejornal e fiquei bem triste por ter que cancelar, mas foi por um bom motivo, e não me arrependi. O meu companheiro Tupam, um cão que tinha desde bebé, já estava com 13 anos de idade e estava bastante doente. Entretanto melhorou e marquei nova viagem, esta que vos estou a descrever.
Foram momentos como este que passei na ilha que me deram força para ultrapassar o processo seguinte e a batalha que enfrentamos juntos, o Tupam infelizmente faleceu no Junho seguinte.
Muitas pessoas questionam o que me leva a voltar frequentemente à Islândia. Não sei ao certo se foram momentos como este, a paisagem natural e virgem, o contacto com a vida selvagem, as várias quedas de água, os momentos de relax nos potes de agua quente…!!! A verdade é que a Islândia é um país maravilhoso, de uma beleza única e com tanto para descobrir, onde não me canso de desfrutar momentos serenos e contemplar o horizonte longínquo. Desde então já fiz 7 viagens e não ficarei por aqui.
Obrigado à Andreia Ferreira por me ter ajudado a rever o texto 🙂